Artigo
Entendemos a necessidade de pensar em alguns indicativos constitucionais quando o assunto é obra psicografada e sua proteção legal.
Os dois primeiros são os incisos IV e IX do artigo 5º da Constituição Federal que protege a livre manifestação do pensamento e a livre expressão da atividade intelectual.
O segundo, que é a complementação do primeiro ponto acima e tão importante quanto, pois protegido no inciso VI do mesmo preceito constitucional é a “inviolabilidade da liberdade de crença, sendo assegurado o livro exercício do culto religioso”.
Há poucos casos citados pela doutrina sobre ações envolvendo a psicografia e direitos autorais. O mais famoso é da família de Humberto Campos que processou Chico Xavier e a Editora, contado com clareza no livro “A psicografia antes dos Tribunais” de Miguel Timponi.
No entanto, não podemos deixar de pensar que o “autor psicografado” muitas vezes por ser famoso, é quem faz com que a venda da obra literária seja um sucesso e, sempre pensando em questões patrimoniais, é a ele conferido o crédito pelo escrito da obra.
Portanto, o uso do Nome do Morto psicografado é outra polêmica para discutir sobre direitos da obra, e que não necessariamente será sobre a tese de direitos autorais, mas sim sobre os direitos de personalidade.
Carlos Alberto Bittar, no livro Direito de Autor, página 36, destaca um ponto importante sobre a obra psicografada, mas é taxativo ao afirmar que o direito autoral pertence ao autor do escrito. Seu posicionamento se resume: “Outra questão particular nessa matéria é a da obra psicografada, que vem, com a evolução do espiritismo, formando literatura própria e com editoras especializadas. É a obra realizada por uma pessoa (médium) que a recebe de um espírito de luz, normalmente, transformada aquela em veículo material. Mas, como a questão envolve conotações metajurídicas e na comunicação da obra aparece o nome do elaborador material, a este compete o respectivo exercício, que, aliás, vem sendo efetivado, à generalidade, em prol de campanhas beneficentes promovidas pelas entidades espíritas, responsáveis quanto à publicação”.
No entanto, há ainda aqueles que comungam da tese de que há divisão de direitos entre o “autor psicografado” e do médium, apontam que este último, tal como o interprete, possui direitos conexos, nos termos do artigo 90 da Lei n. 9.610/98.
Porém, os herdeiros do autor psicografado, por total ausência legal, não teria os direitos autorias decorrentes desta criação, já que “a existência da pessoa natural termina com a morte”, a teor da primeira parte do artigo 6º do Código Civil.
No entanto, entendemos que a família do psicografado poderia, através de medidas acautelatórias, proteger e preservar o nome do falecido ou o conteúdo de uma obra supostamente plagiada, tomando como norte o artigo 17 do Código Civil: “O nome da pessoa não pode ser empregado por outrem em publicações ou representações que a exponham ao desprezo público, ainda quando não haja intenção difamatória”. Ainda que seja o nome de uma pessoa já falecida.
Mesmo que na literatura psicografada não haja “desprezo público”, sobre este tipo de procedimento e as questões envolvendo direitos autorais, o fato é que o artigo 20 do Código Civil determina que tais indicações do uso de nome de terceiro somente poderão ocorrer com autorização por escrito.
Assim, o cônjuge supérstite ou seus herdeiros, poderá, em nosso entender, reclamar infração ao direito de personalidade por uso indevido do nome do falecido e não ao direito moral e/ou autoral do autor.
Isto porque, se reconhecido a possibilidade da família reclamar o direito moral do autor, estaríamos acolhendo a tese de que (i) o falecido adquiriu direitos depois da morte – o que é vedado em lei – (ii) e, consequentemente, o reconhecimento de obra psicografada e, portanto, a declaração, ainda que indireta, do espiritismo como religião ou ainda do próprio fenômeno mediúnico.
O reclamo do direito moral do autor também levaria a improcedência do pedido.
A tese a ser utilizada seria a de ofensa ao direito de personalidade, com a utilização de uso indevido de nome de terceiro, ainda que denominado “Espírito de fulano de tal”.
Na realidade, estaríamos diante, repita-se, da proteção a outra norma legal e não de direitos autorais.
Portanto, a tese inicial permanece a mesma. Só é detentor de direitos a pessoa viva, exceto se tratar de obra póstuma ou que o autor, no curso de seu trabalho, tenha falecido e outro tenha dado continuidade aos seus escritos. Mesmo neste caso, teríamos co-autoria de obra, com divisão de créditos e de direitos autorais.
Bom... é isto! Até o próximo texto!